12/02/11

Eu não sei escrever sobre amor

Perdoem-me a ignorância ou a falta de memória mas já era tarde quando li ou vi, não tenho bem a certeza, alguém a indagar retrospectivas amorosas. Alguém que expressou a necessidade de o ser humano não compreender o amor. E de facto, este pensamento, fez-me coçar a barba, minha eterna conselheira.

A necessidade de decorarmos datas, feitos e factos, ruídos e rugidos, viagens e jantares, é uma prática corrente, um pergaminho de auxílio para se retratar uma relação. Sem ela muitos se sentiriam vazios. Sem oportunidades de comemoração, sem dias fúteis de discussão em que o esquecimento de uma dessas datas pode ditar o fim. Sem mais espaços exclusivos, a conversa não termina, a música muda de ritmo, o olhar distancia-se e muitas vezes, muda de cor.

Há quem use o relógio. “Um banco por favor”, retira-se o relógio da parede para poder descansar, o ponteiro das horas já estava perro e o dos segundos parecia uma corneta viking a mandar reunir os seus guerreiros. Esquecem-se que quando o recolocam por cima da lareira, ele não se acerta sozinho. Nem sempre a extracção da ferrugem e do pó é sinal de que os ponteiros vão ganhar novo sangue.

As pessoas precisam de documentar o amor, para no fim fazerem uma fogueira de despedida, com lágrimas de fúria e desilusão. O amor é uma invenção abstracta que tem como objectivo não ser entendida, colocar as pessoas a pensar, e outras vezes, vincar desgostos e criar ódios. E quanto mais se pretende perceber os meandros de algo que rege a nossa vida, mais confuso se fica, mais tempo se gasta em livros da Grécia Antiga, mais raízes negras se propagam e contaminam os sentimentos. E menos se comunica, menos se estende a mão, menos se escrevem romances sem clichés. E sobretudo, mais se mente em relação ao que se sente.

Cada um define o amor como o pretende viver. Eu não percebo o amor, nem quero perceber.

Miguel Branco

9 comentários:

  1. por isso é que nos re-inventamos, não criamos padrões e não permitimos definições. e essa a magia oh...

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  2. Documentamos o amor para depois o podermos chorar. Verdade.
    Ainda bem que conseguimos que tudo seja tão mais complexo e infinitamente apetecível. Só assim é quem tem piada. Sem datas nem motivos.

    Continua, parabéns ;)

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  3. "Eu não percebo o amor, nem quero perceber."
    A melhor parte é exactamente essa, não tentar perceber. Não atribuir uma definição. Aceitá-lo e torná-lo flexível.

    (Sabe bem passar por aqui.)

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  4. «E sobretudo mais se mente em relação ao que se sente», deves ter ido buscar esta frase a algum desses livros da Grécia Antiga. É daquelas frases que marcam e nos poem a pensar.
    Well done!

    (http://www.youtube.com/watch?v=JKsc5blxCXI)

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  5. és completamente dama bete, boavida lol. Obrigado minha gente.

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  6. Obrigado a mim também, que te brindo com amor todos os dias, e pontualmente com um temporal antes "do" jantar

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  7. a ti agradeço-te todos os dias, mas não digo a ninguém, nem sequer aquele taxista filho de deus

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  8. nao gostei da comparaçao à dama bete. mandei link pq o teu texto piroso fez me lembrar da musica ahah

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