22/03/12

Espelho Partido

Nem sempre me lembro onde estive. Com quem troquei desassossegos escondidos, com quem partilhei o silêncio sem pagar, com quem dancei poesia gasta e banal. Não me recordo da roupa que usei, nem de olhar as horas, nem de ser preguiçoso e idealista, como sempre sou. Encho-me de mim, dos devaneios de miúdo, das expressões dispensáveis, do cheiro a lágrimas nunca confessadas, das conversas necessárias que prefiro não ter para não me ouvir toda a manhã seguinte.



Não me lembro porquê. Não me lembro de esperar por mim, nem de me repetir constantemente, nem de pedir um café e deixá-lo arrefecer. Não me recordo de querer ser mais e ver os dias a passar discretamente. Mal sei o que me contou o meu espelho. Talvez precise de não me lembrar. Talvez não queira. Talvez não consiga. Talvez me lembre quando não me restar mais nada.







Miguel Branco